quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Ministério Público investiga “Operação Reboque”, em Magé

Site o Mangue publicou há bem pouco tempo matéria extensa e esclarecedora sobre as arbitrariedades da operação ilegal batizada como Calçada Limpa, da Prefeitura de Magé, que teria como principal objetivo a arrecadação de recursos para a candidata do governo municipal Nestor Vidal, para deputada, Sônia Sthoffel.  Para mais detalhes, leia abaixo a quase íntegra da matéria. A imagem também é do Site O Mangue.

Pelo menos desde o começo do ano, o assunto que vem ganhando as estreitas ruas de Magé é a chamada Operação Calçada Limpa, mais conhecida como “Operação Reboque”. Oficialmente apoiadas pela Secretaria Municipal de Transportes, mas lideradas na prática pela Secretaria Municipal de Segurança Pública, as retiradas de veículos estacionados em lugares proibidos vêm sufocando motoristas e gerando muita receita e polêmica. Não é incomum se ouvir, por exemplo, que, mais do que uma tentativa de se pôr ordem ao passeio público (“nos moldes do Rio de Janeiro”), a operação na verdade tem como fim a arrecadação de fundos para o financiamento de campanha da candidata do governo municipal a uma vaga na Alerj, Sônia Oliveira (ex-secretária de governo, e que na carreira política utiliza o sobrenome de casada: Sthoffel).
Muitos são os que reclamam (também nas redes sociais) do valor destinado à operação (o contrato da Prefeitura com a firma prevê gastos, em um ano, de quase um milhão de reais), dizendo que tal montante deveria ser aplicado em prioridades como a Saúde e a Educação, serviços que ainda deixam tanto a desejar em Magé. Outras conjecturas já incidiram sobre um seriado de supostas irregularidades da administração pública no desencadeamento das ações, dentre as quais: participação de policiais militares e guardas de trânsito não credenciados para a operação, policiais militares conduzindo motos apreendidas ao depósito municipal (quando deveriam conduzir a depósitos estaduais e não pilotando, e sim em cima do reboque), “vista grossa” dos agentes de trânsito para carros oficiais e de amigos estacionados indevidamente, a não regulamentação do depósito municipal, a danificação de freios de mão dos veículos durante o reboque, o sumiço de pertences no interior dos veículos, já que até pouco tempo os mesmos não eram  lacrados (também não existe decreto municipal versando sobre isso), acordos secretos entre donos de estacionamentos, e políticos etc.

MP instaura Procedimento Preparatório

Não à toa o Ministério Público Estadual, através da 3ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Itaboraí- Magé, já se pronunciou sobre o caso, emitindo uma nota no dia 13 de junho, que diz: “Foi instaurado no âmbito do Ministério Público,
no dia 13 de maio do corrente ano, o Procedimento Preparatório 28/2014, com o objetivo de apurar as denúncias de que veículos estariam sendo apreendidos e conduzidos, indevidamente, ao depósito público municipal desta comarca. O procedimento ainda está em fase de apuração dos fatos, prestação de esclarecimentos por parte do Procurador Geral do Município e averiguação do título que vem embasando essas apreensões, se de fato são ilegais”. Assinada pela promotora de Justiça Anna Carolina Vieira Lisboa Fernandes, a nota, enviada por email, prossegue: “Confirmadas as irregularidades, serão adotadas pelo Parquet as medidas extrajudiciais/judiciais que se revelarem cabíveis”.

Vereadores acionam MP

A promotoria, no entanto, preferiu não comentar o Ofício-Denúncia encaminhado a ela pelo gabinete do vereador Léo da Vila no dia 27 de maio. Além de Leo, assinam o documento: Eliane Sepúlveda, Geraldo Gerpe, Vandro Família e Carlinhos da Ambulância (este último, o único, entre os 17 vereadores a se intitular “de oposição”). Carlinhos, inclusive, mandou confeccionar adesivos criticando a operação. Já outros parlamentares, que por um motivo ou outro não assinaram o documento, deixaram registrado na Tribuna sua insatisfação, como o vereador Silmar, que recentemente se indispôs com um guarda de trânsito que queria rebocar o carro de seu genro, que ao que parece, estaria dentro das legalidades. O ofício aponta para supostas infrações, que acabam recaindo sobre o Poder Executivo, dentre as quais: “os motoristas são compelidos ao pagamento de todas as multas que pesem sobre o veículo para sua liberação, em flagrante desrespeito ao verbete de nº 510 da súmula de Jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça”. Ou: “a empresa que realiza o reboque, administra o depósito e recebe tal valor dos contribuintes não emite recibo (…), em flagrante ato que, em tese configura crime contra a ordem financeira e tributária”. Ou ainda: “as ruas situadas no perímetro urbano são (…) desprovidas de placas sinalizatórias (…) e ainda assim, diversos veículos estão sendo rebocados (…) em flagrante abuso de autoridade”.
O próprio secretário de Segurança Pública, Sérgio Venâncio, que já admitiu um lucro para os cofres municipais, de R$ 30 mil por mês com as multas (quando os reboques eram feitos ainda sem a terceirização da empresa!), já foi convidado por duas vezes a comparecer à Câmara Municipal de Magé para prestar esclarecimentos. A primeira audiência foi marcada para 30 de abril, e a segunda para 15 de maio. Em ambas o secretário faltou sem enviar justificativas; e nova data deverá ser marcada.
Apesar de recusar o convite, o secretário seria peça fundamental para dar luz a uma sucessão de questionamentos
que pairam sobre a operação. Por exemplo, no dia 17 de fevereiro, durante a reunião do Comitê do Consórcio Intermunicipal de Segurança da Baixada Fluminense (que aconteceu na Câmara de Magé), ao anunciar o sistema de reboques que o município estava implantando, o secretário disse que não sabia “qual seria a empresa a ser contratada”. Porém, o Boletim Informativo Oficial (BIO) número 465 torna público que no dia 13 de fevereiro (portanto quatro dias antes da declaração do secretário) houve um Pregão Presencial, que deu origem à Ata de Registro de Preços em nome da empresa ADM Golden Car Multimarcas LTDA ME, com sede na Av. Dom Helder Câmara, 3885, em Del Castilho. O valor do aluguel de seis reboques (“e seus respectivos operadores”) ficou fixado em R$ 987.782, 40. Há quem diga que daria pra comprar um carro de reboque por mês durante um ano.
Mas o fato termina revelando uma situação talvez ainda mais grave: o BIO 465 só foi publicado entre 16 e 31 de março, logo, a publicidade dada ao
processo pode ser questionada na Justiça. Não há vestígios sobre o edital de Convocação ao Pregão, nem informações sobre outras empresas que tenham participado. Em Armação dos Búzios por exemplo, o atraso nos BIO (lá chamados de BO – Boletim Oficial) está levando o prefeito e médico
André Granado (PSC) a sofrer pedido de impeachment pela Câmara Municipal. Lá, os edis descobriram um esquema que desviou mais de R$ 20 mil dos cofres públicos, beneficiando a empresas que participavam de licitações sem que essas fossem devidamente divulgadas, por causa de “atrasos” no BO.

Prefeitura fere o Código Nacional de Trânsito

Não haveria espaço para a reportagem publicar todas as histórias de motoristas contra a Prefeitura de Magé, ouvidas nos últimos dias. A advogada Juliana Magalhães, sócia no escritório Mello de Almeida Advogados Associados, tem sido muito procurada para representar tais casos. E detalha alguns dos infrigimentos da Lei que a Prefeitura vem praticando: - Para aplicar os Autos de Infração não basta ser guarda de trânsito concursado, tem que ter Portaria, identificação da credencial; e o município tem que ser credenciado junto ao Sistema Nacional de Trânsito, coisa que não temos a certeza se é ou não. As guias não trazem nenhuma indicação dos outros
órgãos – explica Juliana, acrescentando:
- O carro de uma pessoa foi rebocado, e como a Prefeitura não emite nenhum comunicado nesses casos (ao contrário do que acontece em muitos municípios), ela pensou que o carro houvesse sido furtado e foi na delegacia registrar queixa. De lá
sugeriram que ela fosse ao depósito municipal procurar. O carro estava lá, mas se recusaram a receber os valores (R$ 134,33 do reboque e R$ 54,27 de diária), dizendo que era ponto facultativo e não havia ninguém na Prefeitura. Mas como que para rebocar não existe ponto facultativo nem final de semana? Isso foi no feriadão da Páscoa, e o carro teve que ficar lá por quatro dias. Eu entendo isso como apreensão, e não remoção. Prefeitura não pode apreender, isso é prerrogativa do estado. A medida administrativa para veículos removidos em lugares proibidos, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, é apenas multa. Não é uma penalidade, não é apreensão. Apenas retira-se o veículo para liberar o trânsito. Uma vez que a pessoa
esteja disposta a pagar, a Prefeitura não pode se negar a receber, seja porque não há funcionários, seja porque o sistema está fora do ar. Além do mais, o BIO que deveria informar sobre o ponto facultativo, só foi circular no mês seguinte. A advogada lembra que danos materiais e/ou morais que porventura ocorrerem, também devem ser alvos de ação judicial:
- Por exemplo, há casos em que o freio de mão dos veículos voltam danificados e eles nem sequer informam aos proprietários. A pessoa percebe, fala com eles, e só aí dizem para procurar uma determinada oficina. A oficina em questão é a Glaucio Car, cuja especialidade é elétrica e som. Ela fica situada na Avenida Ayrton Senna, no primeiro distrito. Lá os funcionários confirmaram que fazem o serviço, porém não emitem nota fiscal pelo mesmo. A Advogada ainda percebe uma falha no Ofício-Denúncia enviado pela Câmara ao MP:
- É bom deixar claro que o valor das diárias do reboque é arrecadado pela Prefeitura, e não pela empresa em questão.
Juliana cita a primeira coisa que a pessoa deve fazer para recorrer das multas: procurar a JARI – Junta Administrativa de Recursos de Infrações, que, no caso funciona na própria Secretaria Municipal de Segurança Pública. Ela lembra também que a pessoa tem o direito de retirar seus pertences de dentro
do carro antes dele ser rebocado (embora em alguns casos isso também não venha sendo observado), e também de retirar o veículo do local proibido, caso chegue a tempo. E mais: - O artigo 24, inciso 10, do CTB, diz que “cabe ao município implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas vias”. Isso não acontece aqui. Quem sabe, se isso acontecesse por aqui, a funcionária da Câmara Municipal Renata Rangel não precisasse ter seu carro roubado. Era um domingo por volta das 18h, quando o padre interrompeu a missa para pedir que os fieis fossem retirar seus carros da rua, pois a Prefeitura estava levando-os. Renata achou que não era preciso retirar seu Gol, pois ele estava em lugar legal. Mas, pra sua triste surpresa, ao chegar no local pra ir embora, o veículo não estava lá. E também não estava no depósito municipal. “Meu carro foi furtado bem na hora e no lugar que acontecia a Operação Reboque”, fala Renata.
Talvez, por tanta polêmica, a operação tenha dado um tempo, coisa de uns dez dias. Mas nessa semana voltou com força total, inclusive em lugares onde andava de forma tímida, como Santo Aleixo. Ascom não comunica, mas articula Projetos de Leis. Bem que a reportagem tentou entrevistar o secretário Sérgio Venâncio, porém ele foi impedido pela
coordenadora (que faz as vestes de secretária) de Comunicação, a jornalista (como gosta de ser chamada) carioca Marcia Rosário. Esta pediu que a reportagem lhe enviasse a “pauta” do encontro ao seu email, no que de pronto foi atendida, recebendo não só “a pauta”, mas as próprias perguntas, para que escolhesse: ou enviasse as respostas ou marcasse uma entrevista. Porém, a coordenadora, já conhecida pela imprensa local por esconder boa
dose de arrogância por trás do riso forçado, mais uma vez agiu com desdém. De posse das perguntas do site O Mangue, ao invés de providenciar as respostas, tratou de confeccionar mensagens do Executivo para que a Câmara Municipal vote em caráter de urgência, assuntos como a regularização do depósito municipal. O projeto deve ser votado na semana que vem, numa tentativa de continuar a operação. Até, quem sabe, esta seja “rebocada” de vez pelo MP.
Em tempo: o Sr. Alexandre, gerente do Detran em Magé, preferiu não gravar entrevista.
Perguntas enviadas à Márcia Rosário no último dia 16, e que ela se recusou a responder:
1 – Qual nome da empresa que atua terceirizando o sistema de reboques no município? Desde quando ela atua e como foi o processo de licitação (peço
uma cópia da publicidade dada à abertura do processo licitatório).
2 – Durante a reunião do comitê de segurança na Câmara Municipal de Magé, no dia 26 de fevereiro (portanto antes da empresa começar a atuar), o secretário Sérgio Venâncio informou que o município estava arrecadando em média trinta mil reais por mês com multas de trânsito. Quais os números
atualizados a partir da efetivação da empresa, e o que comprova a aplicação de parte desses valores em forma de benefícios ao município?
3 – Qual documentação comprova que o município de Magé está credenciado ao Sistema Nacional de Trânsito para que esteja apto a emitir multas?
4 – Existem Portarias do município que deleguem poderes aos agentes de trânsito para estes poderem aplicar os autos de infração? Em caso positivo, é
possível ver as publicações?
5 – Qual dispositivo (decreto?) regulariza o funcionamento do depósito municipal?
6 – Porque é comum ver Policiais Militares chegando ao depósito conduzindo veículos, uma vez que o depósito é somente municipal e a maneira correta do veículo chegar é em cima dos reboques e não conduzido por terceiros? Já houve casos de os próprios proprietários dos veículos acompanharem situações como essa, aparentemente irregular.
7 – Qual procedimento as pessoas devem ter para recorrer das multas, caso sintam-se injustiçadas?
8 – Existem casos em que o município vem confundindo remoção com apreensão? Por exemplo, nos finais de semana os funcionários do pátio têm se recusado a liberar os veículos, alegando que a Prefeitura não está funcionando.
9 – Há casos em que a Polícia Militar atua no reforço às operações? Se sim, é possível o acesso às cópias dos ofícios enviados ao 34º BPM requisitando tal apoio?
10 – Como se dá a negociação com a oficina Gláucio Car, para reparos nos freios de mão danificados durante a operação? Porque ela foi escolhida para tal fim e porque o proprietário se recusa a dar notas fiscais dos serviços prestados?
11 – O município concorda que algumas questões legais foram esquecidas, na hora de colocar a operação em prática? Por exemplo, há uma lei do Código de Trânsito Brasileiro que versa sobre a obrigatoriedade de os municípios manterem Estacionamentos Rotativos.

12 – Segundo uma promotora do Ministério Público, um Procedimento Preparatório já foi instaurado para averiguar as questões relativas a operação reboque. O município já foi notificado? Qual é a opinião do Secretário quanto a isso?

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