Demétrio Sena, Magé - RJ.
Vejo
em alguns jovens dotados de talento artístico ou literário, aquela
pretensão que só hoje reconheço lá no passado, em algum tempo de minha
juventude. Fui um jovem pretensioso. Com aparência humilde, fala mansa e
pautada, porém sonso. Quase nunca me misturava com as pessoas realmente
humildes de coração; e quando o fazia, era para impor personalidade.
Queria sempre, com sutileza e disfarce, catequizar as pessoas ao meu
redor para que se adequassem aos meus gostos pessoais e me admirassem.
Só assim os considerava merecedores de minha amizade, aquiescência, ou
da pretensa honra de participar do meu grupo cada vez mais escasso.
Afinal de contas, eu não passava de um chato.
Ao
invés de amigo, era líder; tinha sempre um bondoso ar superior; gostava
de corrigir falas, posturas, ideologias e gostos. Fugia constantemente
das boas conversas fúteis. Só batia "papo-cabeça". Levava um medo
sobre-humano de ser bobo e só queria saber de filmes profundos; poemas
rebuscados; músicas intelectuais ou de protestos. Nada que vinha do
exterior podia ser melhor do que a cultura nacional. Se tivesse
oportunidade, incendiava o McDonald's. Se conhecesse o Paulo Coelho,
mataria. Jamais reconheceria como genial uma obra elaborada por um
artista ou escritor que já fosse reconhecido publicamente como brega.
Era escravo da crítica especializada e não dava o braço a torcer para
nenhum grande projeto social, se ele fosse de um ativista ou político da
direita.
Hoje
não sei se ainda sou um chato, mas acho que aprendi um pouco. Pelo
menos um pouco. Talvez o suficiente para não ser solitário. Já sei me
dobrar à sabedoria natural do menos letrado. Como educador, aprendi a me
educar com os alunos. Já não imponho meus escritos; exponho. Pergunto
mais do que afirmo. Ouço mais do que falo. Dou mais atenção do que
exijo. Mais valor à mensagem do que à correção gramatical de um texto.
Ouço mais o que fazem do que o que dizem. Aprecio qualquer canção que me
faça bem, não importa o estilo. Basta me fazer bem; seja pela mensagem,
o ritmo, a lembrança que traz ou outra sensação que me dê prazer. E o
que me dá prazer neste momento não tem que ser o que me abone como
intelectual, profundo, inteligente ou descolado. Aprendi a me misturar e
absorver o que há de bom na mistura. Demorei, mas acho que agora estou
crescendo; e talvez a tempo.
Não
posso criticar esses jovens dotados de talento, que hoje vejo como num
retrovisor. Eles estão se construindo, como tive a chance de fazer.
Evidentemente, não gosto de pensar no que ainda sofrerão por se
cultuarem tanto; por se tornarem solitários entre a multidão; por se auto excluírem
nos seus andores, que são de barro, vão se quebrar um dia, quebrando-os
junto. Mas, como acabei de afirmar, eles estão se construindo... e
poderão se reconstruir, como acho que me ocorre. E se apenas o tempo foi
capaz de me dar esta lição, não posso nem pensar em aplicá-la por conta
própria, sob pena de estar desaprendendo o que aprendi até hoje.
Nenhum comentário:
Postar um comentário