quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Artigo - EXCLUSÃO, MALDADE OU INJUSTIÇA,

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quando vi pela primeira vez um indivíduo contar histórias mirabolantes de superação, simplesmente para vender doces ou badulaques em um coletivo, minha desconfiança foi imediata. Logo me armei para não cair na esparrela, passando a não comprar nada que tais pessoas oferecem. Ninguém precisa ter conhecido o inferno, para ganhar o crédito e a boa fé das pessoas. Quem deseja comer um doce, adquirir uma caneta ou lanterninha, pode simplesmente fazê-lo sem antes ter que ouvir as aventuras de um ex-viciado em maconha, cocaína, crack ou estrume. Toda essa estratégia tira o sabor do doce; o prazer de utilizar o artigo adquirido.
Mas devo confessar que minha desconfiança chegou a extremos. Depois de um tempo, ainda que precisasse do item oferecido pelo quase pedinte, meu radar "anti-otário" não me deixava comprar. Eu ficava querendo, mas não comprava. Fiquei viciado em não comprar na condução, mesmo que mais tarde fosse procurar uma loja distante, para fazê-lo. Minha prevenção se tornou maldade; preconceito. Minha blindagem tanto não deixava o sujeito se aproximar, quanto não me deixava sair de mim para confessar de alguma forma, que afinal precisava ou simplesmente gostara do seu produto, e por isso, queria comprar.
Pela turrice ou impertinência em não reconhecer no meu íntimo as causas decorrentes daquela primeira decisão, acabei por me acumular negativamente: como já não era do tipo que compra só para ajudar, tornara-me também do tipo que não compra só para não ajudar. De repente, fazia o que mais condenei a vida inteira, no ser humano: praticava exclusão. Queria ser justo, não fazer assistencialismo trabalhista em nenhuma instância ou setor, mas me permiti ser injusto em muitas ocasiões, ao não consumir o produto nem contratar a mão-de-obra da qual precisava ou queria, em razão do meu medo bobo de me fazerem de bobo.
Continuo não gostando nem um pouco das abordagens gaiatas, mentirosas ou não, mas ainda assim constrangedoras e às vezes de cunho veladamente ameaçador, de alguns ambulantes em coletivos. Mas tomara que eu tenha me redimido, em tempo hábil, do radicalismo em que me flagrei. Ou que não esteja, mesmo sem querer, praticando nenhuma outra forma de preconceito, exclusão, maldade ou injustiça. 

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